terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Quem não chorou?


Eu chorei, quem não chorou?


Chorei a perda de meu país para os ditadores do falso milagre.

Chorei a anistia, chorei a queda do Muro de Berlim.

Aliás, chorei o nazismo, chorei o Apartheid e a morte do sonho de igualdade entre os homens.

Chorei a injustiça nossa de cada dia, que consagra ladrões de terno e gravata e relega homens de bem às calçadas da indiferença.

Por isso chorei quando me senti injustiçado, mesmo que durante noventa minutos de um jogo. Ora, o que é um jogo? A vida é um jogo. Meu jogo é minha vida.

Mas chorei com dignidade, porque as lágrimas me foram concebidas com o milagre da vida. Com elas me entristeço, dou gritos de alegria, mostro minha revolta, revelo minha gratidão. Com elas vivo meu jogo diário de vitórias e derrotas.

Eu não atiro.

Armas foram feitas por homens para matar homens.

Para matar sonhos, para plantar a desigualdade, para semear a discórdia e dizimar a humanidade.

Infeliz de quem atira no companheiro de trabalho, no colega de equipe, na alegria de um gol, no adversário de campo, na euforia da vitória, no time que o acolheu.

De quem nasceu para atirar só posso lamentar o choro dissimulado que não verte lágrimas e debocha do sentimento alheio.

Porque artilheiro de verdade só sabe atirar bolas para o gol. Ele balança redes e espalha alegria para um povo sofrido, que junta cada centavo de seu mês curto para expurgar suas frustrações e se alegrar por míseros noventa minutos.

Meu artilheiro veste o branco da paz, o preto do luto no momento devido e sabe chorar na derrota. Por isso, seguirei aplaudindo até seus erros em campo, porque sei que seu esforço é fruto sua dignidade.

2 comentários:

Anônimo disse...

"E ninguém cala esse chororôôô..." Brincadeira, brincadeira!

Nesse jogo eu percebi que ser Botafogo é ainda mais sofrido que ser Vasco. Juro que foi o primeiro dia em que eu torci para um time do Rio que não fosse o da cruz de malta.

No final, não sabia se eu era o pé frio, ou se o Botafogo, por si só, era um eterno pé frio. Mas, também no final, pensei: exemplos como o do Botafogo é que fazem o futebol ser o que é.

Sempre quando vejo algum jogo com meu pai minha pergunta: qual a graça de ver um bando de homens correndo atrás de uma bola. A graça está justamente aí, na imprevisibilidade, seja sorte ou azar. O que seria do futebol sem juízes que marcam puxões de camisa dentro da área e outros, não? Que seria se não tivesse uma trave no caminho de uma cabeça (quase) certeira aos 48 minutos? Que seria se não houvesse um Edmundo, ídolo de uma torcida cheia de medos e recentes frustrações, para perder pênalti contra o rival?

Fato é que o futebol não teria a menor graça. Não é lá muito engraçado para o Botafogo que perde pelo apito, ou para o Vasco que sai derrotado, mais uma vez, mesmo após merecer a vitória durante os 90 minutos. Mas, sem olhar como torcedor, o maior apelo do futebol, que faz a gente rir e chorar igual menino, é a magia do acaso.

Tomara que juízes nunca deixem de errar. Mas peço a Deus que eles errem sempre a favor do meu time. Que a trave sempre impeça aquele gol feito... do adversário. E que jogadores continuem sem saber como cobrar um pênalti perfeito, mas, que São Januário dê uma forcinha quando os do Vasco estiverem na marca da cal.

Abração, Rafa. Viajei bastante lendo aqui, como sempre. Mas não há reflexão futebolística mais saudável do que essa...

Rafa Barros disse...

Que bom voltar a ler suas respostas! Estavam fazendo falta. A propósito, visitei seu blog outro dia. Bem legal mesmo. Parabéns!