domingo, 8 de abril de 2007

O mundo dá voltas em Rubens

Sei, sei. Foi de propósito. É possível que eu tenha arrancado risadas do amigo. Acho que parece inevitável falar de Barrichello no Brasil sem ser cômico ou trágico, mas juro que vou tentar.

Em 1993, mais um brasileiro chega à principal categoria do automobilismo mundial, e juramos estar diante de uma promessa. Enquanto Senna faz uma de suas exibições de gala, desta vez em Donnington Park, Rubens aproveita a chuva para se destacar. Guia de forma audaciosa, chega a aparecer em segundo e, a quatro voltas do fim, quando se prepara para dividir o pódio com Ayrton... tem problemas com o sistema de abastecimento de seu carro e abandona a corrida.

No ano seguinte, Barrichello passa reto na 'variante baixa', uma curva relativamente fácil do circuito de Ímola. Seu carro se choca contra a barreira de pneus, vira e ele deixa o autódromo desacordado. Desperta atordoado, felizmente com ferimentos leves. No hospital, é consolado pelo seu amigo e grande ídolo Ayrton Senna e, impedido de correr naquele fim-de-semana, vê da televisão a maior tragédia do automobilismo brasileiro.

Grande Prêmio da Áustria de 2002, dia das mães, última volta. E lá vai Cléber Machado narrar a vitória merecida de Rubinho: 'A mãe do Barrichello, Dona Ideli, feliz da vida, vendo o filho ganhar a segunda (corrida na carreira) / Vai ter música da vitória? / A Ferrari vai atrapalhar nosso domingo? / Vem Barrichello. / Encosta o Schumacher. / Hoje não! / Hoje não! / Hoje sim... / Hoje sim? / É inacreditável / Não há a menor necessidade de a Ferrari fazer isso.'

Pois fez. E se cansou de fazer, às vezes de forma mais clara, em outros casos com manobras mais sutis. Assim, Rubinho viu de seu cockpit Schumacher faturar cinco títulos mundiais. Entre curvas e retas da Austrália ao Japão, se alternou entre o fiel escudeiro Sancho Pança e o Cavaleiro da Triste Figura, até se arremessar em 2006 contra a Ferrari para tentar a sorte na Honda.

O desafio parecia tentador: largar o papel de segundo piloto e vestir a capa de super-herói em uma equipe promissora. A Honda inaugurava seu vôo solo na Fórmula 1, embora houvesse vencido quando forneceu motores para outras. Então, não seria exagero dizer que Rubens tinha a cara da equipe, cansada de ser trampolim para o sucesso alheio.

Justamente quando ele imagina que as lentes brasileiras se voltariam para sua aventura nipônica, elas permanecem no carro vermelho. Felipe mal chega e é recebido pelos italianos com sorriso de orelha a orelha. Enquanto isso, Rubinho arrasta sua Honda a duras penas até o fim de uma corrida.

Quando se sai bem, Barrichello é superado pelo novo companheiro de equipe. Enquanto isso, Massa conquista a simpatia de ferraristas e brasileiros. Carismático, audacioso, inteligente. Não faltam adjetivos a quem consegue, de primeira, o que Rubens tentou a vida inteira com homérico insucesso: vencer o Grande Prêmio do Brasil. Pior: com um macacão verde e amarelo feito exatamente para o pupilo que, acredite, Rubinho! Acaba de ganhar de presente a aposentadoria de Schumacher. Hoje não! Hoje sim...

Se Massa roda, excesso de audácia. Se quebra, só acontece com os grandes campeões. Se vence, é o novo Senna. Rubinho continua no diminutivo. Larga mal, tem de se explicar; larga bem, ih... já vi esse filme antes. Quando foi mesmo a última vitória dele?

Chegamos então a 2007. Apelidado carinhosamente de 'meu mundinho', o novo Honda mostra a Terra da perspectiva de um satélite. Finalmente, o piloto que passou 13 azarados anos levando volta do destino, ganha um planeta só dele.

A bordo do Honda ecológico, Rubens conduz sua luta contra as injustiças do mundo, mas não consegue fazer sua Terra completar as voltas que o regulamento determinam. Fossem moinhos de vento, estariam aos pés de Rubens. Como não são, passam sorrateiramente por ele. Cada ultrapassagem que leva o faz lembrar que o tempo não pára. E arrasta com ele as ilusões de uma história promissora, tragicamente abortada nas expectativas de um 1º de maio. Dia do trabalho. Dia em que perdemos Ayrton. E Rubens ganhou um fardo que não o deixa trabalhar.

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Abaixo, você confere a última volta e o pódio do GP da Áustria de 2002, com narração de Cléber Machado e comentários de Reginaldo Leme, pela Rede Globo.

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